21/mai/24Calendário 23/mai/24


Paris - qua 22/mai/24 * 11,33 km * (22 fotos)Mais fotos:ÁlbumSlide showVídeos

Aeroporto de Orly - ParisO colchão era muito bom e a noite teria sido mais tranquila se não tivesse acordado de repente no meio da madrugada. Após as trocas de boas-noites de ontem iniciei o sono merecido. Por alguma razão tive uma sensação estranha e precisei levantar para verificar. Era a segunda tragédia em menos de 48 horas, uma média respeitável. A primeira foi apenas um mal-entendido por alguns instantes e um bolso trocado. Agora esperava que fosse algo semelhante. Tudo começou ontem no terminal de embarque do aeroporto de Lisboa na saída para Paris. Apresentei o passaporte para o controlador e entrei na pequena fila dos passageiros Premium. Fui dos primeiros a embarcar e logo sentei na minha poltrona na janela da fila 21. Não sei o que me absorveu, mas só reparei no mundo ao meu redor quando escutei alguém pedindo meu cartão de embarque. A aeromoça queria conferir com o da passageira que reclamava. Não falei em voz alta, mas tinha certeza de que estava no lugar correto. Quando abri o cartão, percebi o meu erro e, envergonhado e pedindo milhões de desculpas para a dona da poltrona, para o casal que estava de pé no corredor para me dar passagem e para a comissária, voltei para a fileira 26, onde sentei do lado do africano esquisitâo. Na madrugada de hoje, contudo, tive a necessidade de me certificar da presença da bolsa com os passaportes, que não lembrava de ter visto desde a chegada na Cidade Luz. De fato, por mais que procurasse em todo canto, e nem havia tanto canto possível assim, senti o baque de ter perdido os documentos. Olhei nos peitoris das janelas, atrás das mesas e debaixo da cama, lugares totalmente improváveis, e nada. Milhares de pensamentos ocorreram nesta hora: é impossível que tenha sumido, eu tenho sido tão cuidadoso com a pouca bagagem, além de coisas mais esotéricas, do tipo vou acordar e tudo estará no Central de Polícia inútil - Parislugar devido. A única possibilidade era na mochilinha, eu não teria motivo para colocar em outro lugar. Lembrei do incidente do avião e imaginei que aquela teria sido a oportunidade perfeita. Mas todas as consequências se mostraram. Eu não poderia sair de Paris sem papéis e já estava pensando em desmarcar os hotéis e antecipar o regresso. Por outro lado, teria que entrar em contato com as embaixadas de Portugal ou do Brasil para obter permissões provisórias para voltar para casa. Entrei no Google para reconhecer os locais, mas estava decidido a voltar ao aeroporto na manhã seguinte para ver se haviam encontrado. Voltei para a cama e passei boa parte da noite pensando nas sequências de eventos. Achei que podia ter sido quando tirei o casaco que estava espremido na mochila, porém isso tinha sido em Lisboa e era fato que havia saído de lá com a posse do documento, ou não teriam me deixado entrar no avião seguinte. Tinha uma outra teoria, que considerava mais fantasiosa e extravagante, da possibilidade de alguém ter entrado no quarto enquanto eu estava na recepção para remagnetizar a chave, oportunidade em que deixei uma cadeira impedindo o fechamento completo da porta. Pensei em perguntar se havia câmeras no corredor. Finalmente, o colchão confortável e o edredom pesado me mandaram para os braços de Morfeu. Dia novo, clima gelado. Estava difícil sair de baixo do aconchego e me preparar para a rua. Consegui coragem às 8:00 h e, com várias camadas de roupa, caminhei até a parada do ônibus para o aeroporto. As ligações são frequentes, mas estão geralmente cheias. Não era o momento, contudo, para reclamar de detalhes. Cheguei ao terminal e fui logo procurar um balcão da TAP. O único que encontrei estava desprovido de funcionários, com uma tabuleta de volto em breve. Fui para os postos de check-in para ver se haviaTrem entre terminais - Paris outro lugar, porém era para lá mesmo que deveria me dirigir. A atendente, entretanto, foi simpática, dizendo que ia chamar alguém para me ver. Expliquei tudo para a moça, que só falava francês e inglês, e ela começou a ligar para a manutenção. Após falar com os responsáveis pelo setor de objetos perdidos, chegou a notícia de que a equipe de limpeza não havia encontrado nada. Comecei a imaginar possibilidades. Talvez fosse possível antecipar o retorno. Não, minha passagem foi paga com milhas, o que não prevê alterações. Poderia comprar o retorno e o dia 10/jun era o mais barato por € 700,00. Achei que o melhor seria ficar ate o fim de junho em Paris e arranjar algum lugar para ficar todo esse tempo. Perguntei sobre um posto policial para fazer o BO e ela informou que era no outro terminal e que era complicado de chegar. Fui mesmo assim. E era complicado mesmo. Após perguntar para algumas recepcionistas, descobri que existe uma área do aeroporto, chamada Couer dOrly, onde havia a repartição. Nao foi fácil encontrar e estava pronto para abordar alguns policiais que acompanhavam um elemento para a viatura, onde entraram todos antes de eu chegar perto. Comecei a passear pelos arredores do aeroporto e atingi o tal Coração, uma área que abriga vários hotéis e empresas. Num canto, além da Central Térmica, um predinho de portas fechadas estampava a palavra Gendarmerie na fachada. Precisava tocar uma companhia para falar com alguém, que nem se aproximou da grade. Foi só pelo interfone e lá eles não registravam perdas. Deveria procurar na internet. Já estava no modo desisti de tudo e, enquanto a chuva não me expulsasse, ficaria andando. Voltei para o centro com o OrlyBus, que já era meu camarada. Caminhando de volta para planejar a nova fase, começaram os pingos. No quarto entrei no Gmail e encontrei uma mensagem da Entrada das Catacumbas - Parismoça que me deixou desesperançado, pedindo para eu voltar para pegar o reclamado. Pensei em trote. Reparei que havia sido enviada no horário em que estava procurando a polícia lá perto dela. Novamente no ônibus, não conseguia me convencer da realidade da mensagem. A francesa falou que um outro setor havia encontrado e que eles estavam tentando me ligar desde ontem. Realmente havia duas ligações perdidas no celular, de número desconhecido. O conteúdo da bolsa estava todo lá, incluindo os € 800,00, US$ 51,00 e R$ 200,00. Tudo fora da ordem original, mas intacto. O português que me devolveu os pertences confirmou que eles haviam sido encontrados na bolsa da cadeira, não sabia de qual fileira. Não sei por quê eu teria colocado ali. Achei que tivesse caído no caminho ao andar entre um assento e outro, com a mochila escancarada. Retornei ao quarto esgotado e coloquei um ne pas déranger na porta. Apesar disso a faxineira apareceu, prometendo voltar após o outro quarto. Voltou quando eu começava a dormir. Sentei nos degraus em frente ao quarto para aguardar. Enquanto escrevia este relato, uma pancada forte desabou sobre a região e, logo em seguida, voltou o sol. Já havia perdido os documentos na França, só para descobri-los mais tarde, após registrar o desaparecimento junto ao serviço de trens franceses. Naquela oportunidade achei que tivesse deixado sobre a mesa de uma lanchonete da estação. Estava na mochilinha antiga, onde deveria estar e eu não enxergava. O que mais me impressionou com toda esta experiência das últimas 24 horas foi a similaridade do clima com o meu estado de espírito. Quando voltei desiludido da TAP, o caminho para o hotel estava escuro e começava a garoar. Depois do recebimento da mensagem positiva, o sol apareceu e o céu ficou azul. Isso não quer dizer que o tempo não continue lamentável.