Estava muito cansado e sem inspiração para sair cedo e acabei acordando apenas às 9:30 h. Também não estava com vontade de fazer mais uma viagem de trem, mesmo que curta. Achava um desperdício não poder aproveitar o sol na praia mas tão longe do litoral não iria encontrar água salgada. Porém imaginei que houvesse água doce por perto, apesar de o centro de Bolonha não apresentar nenhum grande rio e os córregos serem todos, aparentemente, subterrâneos. Comecei a pesquisar na Internet e descobri um parque nas redondezas em cujas margens passava o Rio Reno, que não era o famoso. Montei uma tentativa de itinerário de aproximadamente dez quilômetros que deveria me conduzir para as proximidades do curso de água. Não sabia como seria a demanda num domingo mas, como nunca havia visto propaganda do lugar, imaginava que somente os habitantes das redondezas frequentassem o local. Saí às 11:15 h, animado com o sol que brilhava através da névoa e cuja luz podia ver entrando pela janela do quarto. Analisando o mapa eletrônico com maior detalhe percebi a existência de uma linha vermelha ao longo do percurso calculado, o que indicava uma ciclovia, em mais um sinal animador. Aproveitei que tinha que ir para o outro lado do terminal de trem, passando pelos corredores sob os trilhos, para comprar a passagem de segunda-feira para a próxima base, tendo a máquina aceitado novamente o cartão de débito sem reclamar. Imaginava encontrar uma ciclovia aos moldes das que tinha visto e percorrido recentemente, mais exclusivas para bicicleta. No entanto o que presenciei no início do caminho para o Rio Reno foram faixas pintadas na calçada para organização do fluxo de pedestres e compartilhamento com os atletas. Ainda perto da estação de trem passei por uma rua cheia de árvores de castanha portuguesa. Só notei porque vi um dos frutos no chão e olhei para cima. Aprendi com a Nevinha, em sua quinta em Possacos, que o que se come cresce dentro de uma bolota verde espinhuda que nasce nos galhos, e as árvores estavam carregadas de bolotas verdes espinhudas. Estava contente de enxergar a faixa identificada no solo e não precisar consultar o mapa a cada esquina para confirmar o caminho. No entanto, quando fui verificar no aplicativo em que altura do percurso estava notei que a pintura se dirigia para outra área do rio e achei melhor fazer um contorno e voltar para a rota original que seguia para o Parque della Chiusa. Através de agradáveis trechos cicloviários cheguei nas margens do Rio Reno, que podia ser cruzado por uma bela ponte de pedestres estaiada. Do outro lado havia uma curta trilha, que segui até a represa que faz o controle hídrico da bacia. Havia algumas pequenas praias de pedra nas margens e alguns pescadores tentavam a rara sorte de domingo. O rio não parecia ser muito piscoso. Voltando para a margem original peguei outra rota de bicicletas, dessa vez sem a presença do tráfego de veículos. Nesse trecho ela seguia paralela ao Canal do Reno e algumas placas informativas me ensinaram que os cursos de água vinham sendo desviados desde o século XIII para fins produtivos, como mover moinhos, ajudar na tecelagem da seda e facilitar a navegação. Entrei no Parco della Chiusa, que imagino que possa ser traduzido por Parque da Eclusa, apesar de não ter visto nenhuma, às 15:00 h e passei uma hora e meia andando pelas trilhas. Logo no inicio, quando admirava as vistas do rio caminhando sem olhar para o chão, tropecei numa raiz de árvore e caí de cara. Não deu tempo nem de ajoelhar ou apoiar os braços. A única escoriação foi um cotovelo descascado mas a experiência foi muito diferente. Parecia que tudo acontecia em câmera lenta e as frações de segundo que durou o acidente lembravam um disco fora de rotação. Entre perceber que bati o pé e escutar a garrafa de água pulando longe e caindo no solo empoeirado não conseguia compreender o que estava acontecendo. Agora acho entendo o que a minha amiga americana Kate Lawrence queria dizer quando explicava sua queda, muito mais grave e com fraturas, como sendo uma pirueta no ar. Sempre achei um exagero o que ela descrevia e agora consigo notar como a percepção humana pode ser traiçoeira. Para não retornar pelo mesmo caminho segui a orientação do mapa eletrônico, que mostrava a continuação da trilha fazendo uma curva e se juntando a uma via pavimentada. Só não falava que tinha que subir uma pirambeira e que o trecho que chegava na estrada havia sido ocupado pelo mato fechado. Não deixei que esses cem metros me atrasassem a vida e enfrentei bravamente os dois obstáculos. Na clareira que surgiu no alto uma italiana me perguntou se dava para passar por ali de bicicleta. Só deu para falar que era molto difficile (procurei no Google antes de escrever) e continuei a descida para retornar ao hotel. Passei num supermercado bem antes de chegar no apartamento mas, temendo não encontrar nada aberto mais para a frente no domingo, o que foi de fato o caso, voltei os quilômetros finais carregado com 3 kg de líquidos e algumas coisas para comer.