Estava decidido a passar o dia na cidade, indo ao terminal apenas para verificar ligações futuras e reenviar os arquivos alterados ontem à noite na cama. Parece que era seguro sair sem o casaco. A questão agora era mais de capa de chuva. Sob clima agradável, iniciei o passeio para resolver os detalhes da ferroviária e iniciei a caminhada em direção ao centro, passando por uma praça com instalações que traziam à memória os parques de Gaudi. Pretendia visitar dois jardins na vizinhança que, porém, estavam inacessíveis. O de Cedros ficava dentro das instalações de uma escola infantil e o das Muralhas estava fechado por perigo de desmoronamento. Passei pela figura quadrangular da Igreja Santa Cruz e entrei numa região meio cerealista, com dois mercados. O mais bonito, de ferro batido no estilo Belle Époque, estava fechado e abandonado. O outro era o dos Capuchinhos, que existia desde 1749, em atividade principalmente para os turistas. Fiquei com vontade de comprar uma cesta de morangos, mas o vendedor antipático só aceitava cartão a partir de € 5,00. Em frente ficava o Museu Etnográfico da Universidade de Bordeaux, em que não entrei, apesar da gratuidade. Sentei por alguns minutos em seus jardins para definir os passos seguintes. Voltei para a Praça da Vitória, com sua Porta da Aquitânia e a coluna torta Les Tortues, passei pela lateral da imponente Sinagoga e entrei no Museu da Aquitânia. Instalado numa construção do séc. XIX, continha exposições divididas em dois andares e envolvendo todos os 400 mil anos de história da região. A mostra tinha início com a parte arqueológica, falando da convivência dos homens primitivos e suas atividades industriais e culturais, passava por uma grande mostra da época romana, quando o assentamento era chamado Burdigala e adentrava a Idade Média e o predominio exercido pela Igreja. Fiquei na dúvida quando percebi a escultura representando São Tiago, a mesma que havia visto na Igreja de São Miguel. Não ficou claro qual era a original. Em princípio, num ambiente envidraçado na instituição cultural, parece que tinha mais chance de sobreviver. Havia a seção dedicada à dominação inglesa através do casamento de Henrique Plantageneta com a duquesa Elenora e a anexação ao Reino da França pelo Rei Carlos VII, na época de Joana dArc. Outro setor era dedicado ao humanista Montaigne, cujo túmulo ocupava um conjunto de salas com dados de sua biografia e um exemplar da edição dos Ensaios, impresa pela primeira vez em 1588. O que se imaginava ser seu corpo foi transportado do local da morte e ocupava lugar de honra na atual bilheteria, antes de ganhar moradia exclusiva. Apareceram, então, os itens relativos à navegação que construiu a riqueza de muitos habitantes, não só com a importação e exportação na rota das plantações das Antilhas e especialmente do Haiti, mas também com a escravidão de negros africanos, aprisionados para trabalho nas fazendas caribenhas. A exposição dava destaque ainda à vocação comercial da cidade e mostrava o desconforto com a utilização de sere humanos nas transações financeiras até a abolição do sistema no final do séc. XVIII, com a Revolução Francesa e a Declaração dos Direitos do Homem. Após passar três horas lendo as informações e vendo os objetos, saí em direção ao Rio Garonne para conhecer novos monumentos. Primeiramente passei pela Ponte de Pedra, que atravessava o largo rio, e pelas portas da Borgonha e Cailhau, uma bela miniatura de castelo. Continuei pela marginal que tinha uma grande parte inacessível, dando a impressão de estar em preparação para algum evento. Na sequência surgiu a Praça da Bolsa e seu espelho de água, intermediando os amplos canteiros floridos. Um cartaz que vi mais para frente falava em festa do vinho, mas não especificava datas, apenas sugeria a visita do site na internet. O parque seguinte era o Quinconces, em cuja entrada do lado fluvial havia duas altas colunas com esculturas de Mercúrio, representando o Comércio e de Ártemis, protetora da Navegação. Uma esplanada separava as escturas de Montesquieu de um lado e Montaigne de outro. Na extremidade da área central havia a grande Coluna dos Girondinos com duas fontes na base. Segui para o Jardim Público que, apesar das placas dizerem o contrário, estava fechado. Já estava tarde demais para continuar o passeio e voltei direto para o hotel, sabendo que ainda teria locais para conhecer em Bordeaux. Depois de arrumar os arquivos, segui para o terminal para usar os 15 minutos necessários para as transferências.