A decolagem no início da madrugada fez com que eu decidisse sair de casa quase doze horas antes, no dia anterior, devido à minha ansiedade e resistência a caminhadas noturnas. Cheguei na Estação da Luz às 12:30 h, em tempo de pegar o trem que deveria sair dentro de meia hora da Barra Funda. Achava que o Aeromóvel só seria inaugurado na época da eleição e, de fato, tive que entrar num ônibus lotado para percorrer os três quilômetros até o terminal internacional. Como esperado, ao me aproximar às 14:00 h do balcão da TAP, não pude registrar a bagagem, que ficou com 3,5 e 5,5 kg. A abertura para o voo do início da manhã só aconteceria depois das 20:00 h. Tomei uma resolução drástica! Confiando nas dimensões reduzidas da mochilona, decidi me livrar dos itens proibidos e passar direto pela inspeção e imigração, sem despachar a bagagem. Já havia recebido o cartão de embarque por e-mail, depois de ter feito o check-in pelo computador em casa. Joguei fora a pasta de dente, o desodorante, o anti-inflamatório, o creme hidratante e o protetor solar. Percebi posteriormente que a escova de dentes, que compartilhava a caixa do dentifrício, também foi para o lixo. Ganhei 700 g e o peso total das duas peças desceu para 8 kg. Imaginava que o tamanho da mochila maior não fosse impeditivo para entrar no avião, já que os passageiros costumavam abordar com malas enormes. Na pior das hipóteses eles iriam vetar e enviar para o porão. O pensamento por trás da ideia genial de viajar sem bagagem era, principalmente passar as dez horas restantes na sala VIP, mais confortável e desimpedida que a sala de espera normal. Descobri que viajantes da Star Alliance, da qual a TAP era participante, podiam acessar a sala do Banco Safra. Apresentei os documentos e fiquei sabendo que, como o meu voo não era de conexão, a utilização era limitada ao máximo de quatro horas antes do embarque. Segui para o lounge da MasterCard, onde a mesma regra se aplicava. Lá, contudo, poderia entrar um pouco mais cedo porque eles fechavam às 23:30 h. De qualquer forma, ainda restavam três horas, pelas quais tive que aguardar ao lado de uma tomada, ouvindo as conversas telefônicas incômodas dos vizinhos. A educação dos usuários das salas especiais, no entanto, não autorizava imaginar que o mesmo problema deixasse de ocorrer em uma delas. A mensagem sonora de um voo anterior para Lisboa solicitava que todas as malas de rodinhas de uma faixa de passageiros deveria ir para a área de carga devido à ocupação total da aeronave. Creio que a minha condição Silver estivesse isenta de tal resolução. Além de não ter rodinhas. Quando havia passado o tempo necessário, fui para a sala VIP do cartão Black. Estava lotada e tive que esperar alguns minutos na fila para entrar. Parecia que eu havia escolhido justamente o horário de maior movimento, quando os únicos locais livres ficavam nos bancos altos de cara para as janelas do fundo. Depois de 30 minutos, vagaram algumas poltronas mais aconchegantes, para onde pude transferir as mochilas e aguardar até o horário de procurar o portão de embarque às 23:00 h. Essas salas transmitiam uma sensação de poder, com suas ofertas de comida e bebida à vontade, mas o que realmente fazia a diferença era o conforto, apesar da lotação e barulho. Achava que elas já deviam ter sido bem mais exclusivas. Atualmente, qualquer um com cartão de crédito razoável poderia frequentar. Enquanto aguardava, iniciei a tentativa de transmissão dos dados para o provedor. Por um equívoco na configuração da página da viagem em São Paulo, esqueci de cadastrar o dia 15, anterior ao início do itinerário. Com isto, creio que seria obrigado a juntar o dia anterior e o inicial num mesmo texto, com as fotos e vídeos das respectivas datas na mesma tela. Isto era apenas cogitação e teria que desenvolver melhor a ideia quando tivesse todas as informações necessárias assim que chegasse em Lisboa. No meu voo não houve ameaça de vetar as rodinhas, apesar de que a lotação também estivesse completa. O embarque na aeronave da Airbus A330 neo foi simples como das outras vezes. No entanto, o meu privilégio de entrar no início era sempre compensando por ter que furar a fila dos normais para chegar ao meu assento no fundo. Como fui dos primeiros a entrar, tive tempo de esconder as alças, barrigueiras e fitas da mochilona com a capa que as cobria, de forma a não atrapalhar as demais malas e proteger a minha. Pela primeira vez usei o bagageiro superior. A pequena, como sempre, viajou ao lado das minhas pernas. Minha vizinha Eliana, brasileira moradora de Fátima há 30 anos, parecia bastante faladora. Felizmente havia trazido uma grande quantidade de livros e se ateve à leitura depois de uma detalhada apresentação nos primeiros minutos da chegada à poltrona. A luz direcional ficou acesa por longo tempo, porém isto não incomodava. Muito melhor do que conversa. A refeição principal foi oferecida um pouco mais cedo e após 90 minutos de voo o serviço estava encerrado. Pude escolher entre as duas opções, ficando com a carne. Contudo achava que a massa talvez tivesse sido melhor companhia para os talheres de madeira. Minha cadeira ficava justamente entre duas janelas, posição ótima para recostar a cabeça na coluna entre elas. Entretanto, isso só valia para o encosto na vertical. Na posição inclinada parecia que o assento da frente levava vantagem neste quesito. Pude passar boa parte do voo dormilando, mesmo sem utilizar o encosto de cabeça improvisado na coluna entre as duas janelas. Duas horas antes do pouso, foi servido o lanche matinal, minha refeição preferida. Foi simples, com uma pequena salada de fruta e baguete com presunto. Estava dividido entre duas opiniões contraditórias sobre a Coca-Cola. Por um lado acreditava em sua propriedade de desentupidora de tubulação. Por outro, sentia os efeitos do gás contribuindo para a revolta nas entranhas. Ciente do poder maléfico da bebida, fiz um pacto pela diminuição no seu consumo, que já havia quebrado no próprio primeiro dia. O pouso ocorreu normalmente às 14:30 h, quatro horas à frente de São Paulo, sob 25°C num dia ensolarado. O piloto estacionou no meio da pista novamente e os ônibus já estavam prontos para o transporte. Meia hora para sair do avião e 10 minutos passeando de ônibus pelo aeroporto levaram até o terminal para imigração. Não estava muito movimentado, mas não poderia deixar de usar o passaporte português. Desta vez entrei na fila dos com chip, que me direcionou aos portais automáticos e não precisei falar com nenhum funcionário. Em alguns segundos estava em território português. Com 12 horas em São Paulo e 18 horas em Lisboa, esta viagem seria marcada pelas longas esperas nos terminais aéreos, que também incluíam noites de semi-vigília. Na volta teria que passar pelo mesmo processo, aguardando o segundo voo marcado para o dia seguinte. Teria tempo suficiente, tanto na ida quanto no retorno, de passar algumas horas passeando pela capital portuguesa. No entanto, esta possibilidade estava quase descartada, após ter decidido carregar toda a bagagem comigo. Talvez encontrasse algum depósito para o item maior, porém não tinha vontade de me deslocar no calor com tempo determinado. As salas VIP teriam que colaborar. Não colaboraram. Após a imigração, entrei na fila dos voos domésticos. A partir daí tudo começou a conspirar, não sei se a favor ou contra, ou a favor ou contra do que. Como ainda faltavam mais de 13 horas para o voo seguinte, o segurança não me deixou passar. Perguntei o que fazer e ele disse que por ali eu não passava, indicando um caminho a seguir que me levou às esteiras de bagagem, que não utilizaria, e ao saguão do setor de chegadas. Estava fora do aeroporto e, sem desejar, em Lisboa. Sem saber ao certo o que fazer, procurei o balcão de informações para saber se existia algum depósito de malas. O atendente apontou mais ou menos o caminho e, após nova indagação, fui direcionado para o meio do estacionamento onde ficavam os inúmeros cacifos automáticos. Passei bom tempo imaginando o que poderia deixar e o que deveria levar no passeio forçado e montei o saco com carregador, documentos, dinheiro, alguns petiscos e duas garrafas de coca que havia pegado na sala VIP de São Paulo e que juntei num frasco de metal, presente de um dos clubes de literatura. Encontrei um armário pequeno vazio, porém grande o suficiente quase para eu entrar. As duas mochilas couberam com folga. Um processo muito rapido e eficiente descontou € 3,00 do cartão VTM e imprimiu um tíquete com a senha para retirada em três horas. O tempo era justo para eu poder entrar novamente na imigração às 19:00 h, como explicado pelo guarda. Havia pegado um mapa oficial de cortesia da cidade no quiosque de informações turísticas, porém não pretendia utilizá-lo. Se necessitasse tinha o meu próprio guia no celular. Do estacionamento era visível parte da área que sediou a Feira Internacional em 1998. Já havia estado lá algumas vezes, no entanto, achei que valia a pena rever. Já até considerava ultrapassar as três horas e pagar um suplemento para a guarda da bagagem. Pretendia verificar o preço adicional, todavia, no último minuto, esqueci. Voltei ao terminal porque reparei que o mapa de Lisboa não estava mais carregado e pretendia usar o Wifi gratuito para atualizar o aplicativo. A rede estava muito lenta e decidi não perder tempo. Peguei a avenida reta na frente do terminal que seguia em direção ao Parque das Nações, região reabilitada para abrigar os eventos e recintos da Feira. Talvez Lisboa já tenha sido uma cidade melhor, mas continua extremamente convidativa e respeitosa. Na curta caminhada até o Rio Tejo, sempre tive prioridade na passagem pelas faixas de pedestres. Eu me esforcei para respeitar os semáforos vermelhos, porém nem todos o faziam. Parecia que esta preocupação não fazia parte da lista de prioridades dos cidadãos. O parque na margem do rio era gigantesco e, apesar da Idade e de ser dia de semana, tinha certo movimento. Era uma área bastante turística, sede de diversos pavilhões e atrações usadas há quase trinta anos e ainda pujante. Ao lado da Estação de trem Oriente, do arquiteto Calatrava, os grandes atrativos eram o Aquário, a Torre Vasco da Gama, o Teleférico e a Arena que iria sediar o show do Roberto Carlos em outubro. Vários jardins tranquilos permeavam as instalações e diversos restaurantes atraiam os visitantes. Não estava completamente preparado para o inesperado passeio, antes de realmente iniciar o itinerário planejado e tendo sido quase empurrado pelas circunstâncias. Apesar delas, a tarde foi totalmente agradável. Voltei para o aeroporto para retirar a bagagem do depósito e tive alguma dificuldade com o sistema, cujo motivo não entendi. Da primeira vez que inseri a senha na máquina, ela falou que eu devia € 6,00. Apresentei o cartão e, aparentemente, nada aconteceu. Era de se esperar que a porta tivesse aberto automaticamente. Não havia ninguém para quem pedir informação e decidi repetir a tentativa. Aproximei o cartão novamente e a porta abriu como esperava. Fiquei com receio que tivesse sido cobrado duplamente, porém o aplicativo de extrato do VTM mostrava apenas dois valores. O original e o suplemento. Devo ter feito algo errado na primeira vez. Creio que a segunda parcela era para o total de 24 horas, sendo que eu havia ultrapassado o prazo em pouco mais de meia hora. Se tivesse lembrado de verificar a hora extra antes do passeio, poderia ter apressado o passo para economizar o adicional. Retirei os itens do saco e devolvi cada um para sua respectiva mochila e segui para a imigração. O prazo apresentado pelo guarda da hora do almoço era de 19:00 h e eram quase 20:00 h. Fui confiante apresentar o cartão de embarque, mas a máquina não aceitou. A nova informação era de que eu só poderia acessar a área segura 12 horas antes e não 13 horas, como havia sido informado inicialmente. Aguardei os poucos minutos na frente do funcionário e no horário determinado ele liberou a minha passagem, dizendo que eu tinha direito à fila rápida, porém poderia arriscar a normal que não apresentava movimento, segundo ele. Mais uma informação distorcida. Vendo a quantidade de pessoas desci novamente perguntando pela fila especial. Foi bem mais rápido e passei por uma inspeção detalhada. Tive que mostrar até as pernas da bermuda que estavam no bolso. Resolvida esta etapa, subi a escada rolante para acessar a sala VIP. Novo empecilho. O meu bilhete só permitia uso das instalações depois de 5:00 h da manha, três horas antes do embarque. Voltei para o saguão, encontrei uma tomada funcionando e tive um pouco de dor da cabeça para transmitir os dados. Depois de um período, como a quantidade de pessoas diminui significativamente, a transferência foi completada.