A previsão do último dia ensolarado da temporada me convenceu a levantar às 7:00 h, meia hora depois de acordar e ficar tentando espantar a preguiça. Pretendia deixar a visita aos monumentos artísticos e arquitetônicos de Florença para os dias chuvosos e saí do quarto às 7:20 h em direção à estação Rifredi para pegar um trem para a praia. O ar ainda estava bem gelado e o sol muito baixo mas o céu claro autorizava otimismo. Que não durou muito por causa da estação ferroviária. Não havia máquina, entre as quatro disponíveis, que aceitasse o cartão e apenas a opção de pagamento eletrônico surgia na tela. Experimentei até o cartão de crédito, que também não funcionou. Além disso não existia bilheteria normal, o que seria um tremendo problema em eventuais viagens em dias próximos. A solução que encontrei foi entrar num trem até a parada principal no centro e lá fazer novas tentativas. Novamente minha intenção foi frustrada. Por duas vezes desci as escadas para trocar de plataforma e cheguei no momento exato em que os trens travavam as portas e iniciavam o curto trajeto, de menos de cinco minutos. Na terceira oportunidade consegui abordar e fiquei treinando uma frase bonita em italiano, justificando a ausência de passagem, para falar para algum cobrador que aparecesse. Não veio ninguém e no novo terminal segui para a sala de bilheterias automáticas. Pude realizar a compra da ida e volta sem reclamação. Acho que já falei que não dá para entender essas máquinas de mente própria, que falam e pensam, mas ainda não andam. O trecho que escolhi ia para Viareggio, um balneário famoso no Mar Tirreno. Provavelmente seria uma daquelas horrorosas sequências de bares e restaurantes que limitam a visão do litoral mas esperava encontrar uma área mais distante em que pudesse caminhar por calçadões à beira da água ou pelo extenso bosque de pinheiros até vizinha Torre del Lago. O caminho ferroviário era bastante longo, com mais de uma hora e meia de duração. A distância nem era tão grande mas as paradas nas estações demoravam bastante. Algumas nuvens cinzentas isoladas ao longo do percurso não tranquilizavam e se acumulavam em torno dos picos de quase dois mil metros de altura que identificavam parques regionais ao longe. Claro que o trem ia exatamente no sentido do maior acúmulo de nuvens e tirava a esperança alimentada pelo maravilhoso céu azul por que passei por mais de uma hora. Não estava muito entusiasmado quando desembarquei às 9:45 h, especialmente ao perceber a retona que fazia parte do desenho ortogonal do centro toda na sombra e com forte vento frio encanado. Segui até a imensa faixa de areia que, como esperado, estava lotada de guarda-sóis desabitados. O calçadão, contudo, era largo e agradável, e conduzia, após atravessar o Rio Burlamacca, à marina, e ao estaleiro. Após uma grande volta atingi outra grande extensão de areia formando uma praia menos organizada. Mas era areia demais para o meu gosto. Segui o contorno do quebra-mar que protegia a marina e tive uma feliz surpresa ao encontrar diversas grandes lajes de mármore, perfeitamente planas e convidativas. Não podia desperdiçar o que poderia ser a última chance de aproveitar o verão europeu e desisti de caminhar até Torre del Lago e seu bosque de pinheiros. E, ao constatar o desaparecimento das nuvens que encobriam os cumes das belas montanhas ao fundo, parei de andar. Pude aproveitar por quatro horas um sol esplêndido, ao som do marejar batendo nas pedras de proteção. Às 15:50 h o trem que vinha de Florença estacionou na plataforma. Com vontade de me arriscar entrei e escolhi um assento no segundo andar de um vagão vazio. Estava bastante seguro, no entanto, de que seria o mesmo que regressaria em vinte minutos e logo pude me tranquilizar com a entrada de outros passageiros e do cobrador. Era uma pena que o litoral ficasse tão longe de Florença, ou poderia fazer esse deslocamento outras vezes, se o tempo permitisse. Era difícil imaginar que as previsões pudessem estar corretas observando o céu maravilhoso que se abriu.